Folha Seca

22:56 Renata Kawane 0 Comments

Não há como pensar em nós, porque nem se quer tenho certeza se um dia nós fomos nós.
E como num labirinto sem saída onde tudo se cruza, se tromba, se encontra, volto a quinhentos e sessenta e três dias atrás .
Volto sozinha, olhando para o chão, para os lados, como se tivesse partido de um local e depois de tanto tempo, regresso.
Depois de furações, terremotos, catástrofes inimagináveis. Sentidas.

As folhas secas no chão, o porta retrato caído, quebrado, como se na hora da partida, ele tivesse sido atirado contra a parede
num ato insano de se quebrar não o objeto, mas o que ele representava.

Sento-me no chão, pego o porta retrato aos cacos, limpo as teias de aranhas acumuladas pelo tempo, e meu peito tranca-se de tal
forma que o ar se prende ali.

Voltar sozinha assusta, ainda mais se não se tem certeza se estava ali acompanhada.

Retiro a foto marcada pelo tempo, sinais videntes de dias de sol e chuva. Atrás dela um papel amarelo, dobrado, intacto.
Era pra você. Você não leu.
Não te culpo. Eu também não leria.

Sorrio com os olhos segurando a primeira lágrima que deseja escapar. Música horrível! -penso
Mas era no momento o que falava o que eu não conseguia dizer.

E minha mente foi longe, relembrando detalhes.

Fiz vendaval, tumultuei, mas só parti porque o pior vendaval foi o que fiz dentro de mim.
Outro foi um carinho que já havia passado, mas em tal momento, onde brota-se do nada,
meu medo viu nele a oportunidade de sair voando e quem sabe encontrar-se seguro.

Medo? Assim como ninguém tem medo de altura e sim de cair, meu medo não era de amar e
sim de ser mandada embora. E se alguém tem que ir, eu vou. E fui!

Hoje, pegando as trilhas das lembranças, pelo caminho da saudade, parei aqui.
Sentada no chão, escrevo no verso do papel algo de uma nova canção.

Arrumo a parte que me cabe da bagunça. Encosto a porta e saio dali deixando na primeira gaveta o mapa para se fazer o caminho de volta.

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